A sabedoria que se obtém aos 40... |
Dizem que depois dos
30 o homem começa a sentir a degradação do corpo. Começa aparecendo uma
barriguinha, no início pequena, quase imperceptível, e que contribui até mesmo para
um certo charme. Nem incomoda. Traz até um certo status de maturidade, até
mesmo símbolo de virilidade. O problema é que a barriguinha evolui com o passar
dos anos. E vira, fatalmente, um conjunto: barriga, pochete e pneu, sendo que a
contiguidade entre eles dificulta até mesmo estabelecermos os limites entre um
e outro.
O problema maior é que
o que antes dos 30 era fácil de perder começa a tornar-se um pouco mais
complicado, e só uma caminhadinha ou um rolê de bicicleta são insuficientes pro
corpo voltar à forma. Parece que o corpo se recusa a abrir mão daqueles pneuzinhos
a mais, talvez por alguma sabedoria celular corporal inconsciente, que saberia
a necessidade de uma barriguinha mais pronunciada ou de um pneuzinho mais
torneado, fazendo questão de mantê-los presos ao corpo, como um mantimento que
economizamos em tempos de guerra.
Eu confesso que não
senti no corpo a passagem dos 30, talvez por uma sabedoria celular corporal
inconsciente, que me possibilitou uma adaptação suave e indolor à nova forma. A
barriguinha foi crescendo devagar, diretamente proporcional ao aumento das
responsabilidades da vida adulta, e inversamente proporcional à quantidade de
cabelos em cima da cabeça. O corpo é sábio, ele sabe economizar a energia vital
nos lugares certos...
... é, a sabedoria
celular... me tirou os fios da cabeça porque devia precisar concentrar a
energia em algum outro lugar... só pode. Ou porque os fios deviam atrapalhar o
fluxo de energia... já que os fios de cabelo se magnetizam, tanto que quando
passamos (passávamos!) a caneta bic no cabelo os fios levantam (levantavam!)...
vai ver é por aí. Essa tal sabedoria celular é esperta mesmo... enfim, só acho que
a sabedoria celular devia ao menos consultar a sabedoria da consciência antes
de tomar uma atitude tão radical, principalmente nessas decisões tão
importantes...
Agora, com os 40 se
aproximando, não fui informado – pelo menos não ainda – de algum axioma dos 40,
algo correlato ao “axioma da barriguinha dos 30”. O problema da barriguinha,
nessa idade, está em geral completamente superado, graças à maturidade que
acompanha a idade, através da compreensão profunda do famoso “axioma do
remédio”: “o que não tem remédio,
remediado está” (também conhecido no padrão inculto como “ligar o foda-se”).
O homem dos 40 é
prático. Dedica-se a resolver problemas, e geralmente é pago pra isso. Normalmente,
se não se separou dos 30 aos 40, não se separa mais, porque é o tipo do homem
que (finalmente) aprendeu a viver com uma mulher. Com um domínio mais aprofundado da sabedoria celular
corporal inconsciente, desliga como um mestre iogue os órgãos sensoriais
auditivos, aperfeiçoando o que a tradição milenar chamaria de “audição
seletiva” (popularmente conhecido como “entra por um ouvido e sai pelo outro”),
constituindo a mais perfeita paz e harmonia na vida conjugal.
O homem dos 40 é
aquele que passou finalmente a tratar as coisas sérias com simplicidade, e as
coisas simples com seriedade, como um verdadeiro sábio chinês. Talvez por isso
o homem de 40 trate com tanta seriedade alguns rituais aperfeiçoados através de
muita prática, disciplina, determinação, sejam eles os etílicos, os gastronômicos,
os esportivos, os musicais, e os autísticos. Eles podem estar separados, mas geralmente funcionam muito bem juntos, combinados.
É uma mudança
importante de perspectiva, mais que filosófica, ontológica: o dilema aos 40 passa a ser se a
barriga dos 30 – aquela que a gente aprendeu a conviver – deve ficar por cima
do cinto ou se a gente puxa a calça e aperta o cinto no meio da barriga...